sábado, junho 17, 2006

A quantificação da beleza

Esse texto, mais do que uma dissertação ou análise, é uma reflexão sobre o Belo, sobre uma possível quantificação do grau de beleza de algo, seja uma pintura, uma música, uma escultura, um texto... Também com esse texto, gostaria de fazer um diálogo com outros textos afins [1, 2], discutindo algumas idéias e ratificando outras a respeito do julgamento do belo e do não-belo.

O que é o “Belo”? Uma vez um professor de história iniciou uma aula fazendo essa pergunta para minha sala. Entre respostas inúteis e comentários desinteressantes, eu preferi ser surdo. Até que depois de vários minutos de zumzumzum ele mesmo respondeu: “O belo é aquilo que representa uma época. Uma obra de arte só é bela se ela fizer sentido e resumir de alguma maneira toda a expressão cultural de uma época.” Achei uma “bela” resposta. Como exemplo, ele citou senão outra, a Gioconda, não só pelos belos traços, mas pelo resumo mecanicista do Iluminismo naquele quadro, pela perfeição simétrica, parecendo ter sido feito com esquadro e régua. Para quem leu o livro de Dan Brown (eu não li ainda) pode haver evidências de outros mistérios acerca da pintura, mas elas ficarão de fora dessa reflexão, pelo menos por enquanto.

Indo um pouco adiante na história da arte, temos a beleza evidente dos versos de Fernando Pessoa. O que fez desse poeta português tão brilhante? Era a pessoa certa na época certa, com os versos de verdades tão múltiplas quanto sinceras: “O poeta é um fingidor./ Finge tão completamente/ Que chega a fingir que é dor/ A dor que deveras sente./ E os que lêem o que escreve,/ Na dor lida sentem bem,/ Não as duas que ele teve,/ Mas só a que eles não têm...” Poetas, críticos literários e muitos outros admiram esse poema (Autopsicografia) não só pelas rimas ricas e idéias bem elaboradas, mas por toda a inovação e beleza que o próprio texto inspira numa metalinguagem simplesmente brilhante, mas não demasiadamente complexa.

E o velho Machado de Assis? Nunca me perdoaria se não o citasse nesta reflexão: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas”. Inusitado, inovador, ousado. A reflexão da relação do homem com o seu mundo. Não se observa a antiga “beleza poética”, mas algo novo. Irônico e sincero: impactante. Talvez nessa contradição a beleza intrínseca da sua obra (Memórias Póstumas de Brás Cubas).

Agora, parafraseando um colega [1], também tenho o Moisés de Michelangelo como uma de minhas esculturas preferidas. Completamente justificável, para mim e para ele, a reação irada do mestre florentino que, após ordená-la a falar, não recebeu nada mais que a indiferença do profeta marmóreo.

Estranho que a justificativa do meu antigo professor de história para o Belo se encaixa de maneira ímpar e impecável para cada um dos exemplos selecionados. Não por algum acaso, com certeza, mas pela precisão encontrada por ele para definir o Belo para mentes “em desenvolvimento” para não dizer “subdesenvolvidas” no colégio. Agora, paremos para analisar o nosso próprio mundo. A era “Contemporânea”, com esse nome dado por historiadores na falta de outro mais significativo, poderia ser resumida a uma obra de arte? Quem conseguiria? Niemeyer? Eu até que não desgosto daquelas curvas todas, seria toda essa curvatura um reflexo da nossa sociedade? Estamos nos desviando do nosso destino ou algo assim? Prefiro as curvas góticas (opa!). A riqueza de detalhes das antigas catedrais é assustadora. Arcos ogivais e altíssimas torres rumo ao infinito. Uma espiritualidade enorme e sem fim. Possivelmente você leitor não gosta de tantas figuras de linguagem em uma só leitura. Então vou evitar as hipérboles, pelo menos, de agora em diante.

Voltando às curvas de Niemeyer. Temos ou não um resumo de nosso tempo? Se bem que o tempo dele já foi, certo? Então teríamos naquelas obras um resumo do século XX? Acho que fica mais fácil analisar isso daqui uns 50, 100 anos... Voltarei a discutir isso, se ainda em vida, daqui a algumas décadas.

Até agora falamos de artes um tanto quanto puras, elitizadas, como diriam alguns. Se formos para o que chamamos de cultura popular, e, mais especificamente, à música, podemos fazer análises ainda mais interessantes sobre o que é belo, de fato, e o que não é.

Dizem os antigos que música é a mistura de poesia, rítmo, harmonia e melodia. Eu, humildemente, introduzo o fator “complexidade” para minha análise. Não por eu me achar demasiadamente inteligente e por pretender entender musicalidades complexas, mas por ter chegado à conclusão de que o grau de “riqueza” de uma música depende da complexidade tanto da mistura de influências, quanto da complexidade de sua própria estruturação.

A sistematização do conhecimento humano e da própria memória em categorias coloca tanto Tati Quebra-Barraco quanto Beethoven na mesma categoria de “compositores”. Ainda bem que existem subcategorias como “Funk” e “Clássico” para separar os dois. Mas eu prefiro separar os compositores em mais duas categorias: “Ruim” e “Bom”. Já estando na devida respectividade de qual dos compositores vai para cada categoria, em ambas as classificações.

Poderíamos usar os critérios já existentes com a minha adição? Vejamos: poesia, ritmo, melodia e complexidade. Todos com pesos iguais, embora saibamos que em músicas instrumentais seria absurdamente injusta uma avaliação pelo item poesia, uma desonestidade sem tamanho. Temos portanto: Tati Quebra-Barraco com uma poesia mais inexistente do que a de Beethoven em seus clássicos instrumentais (desculpe, mas não consegui evitar a hipérbole), um ritmo constante e marcante. Talvez ela passasse com 5 ou 6 numa avaliação de coordenação motora e ritmicidade. Uma melodia invariada, desafinada e odiosa. A harmonia é de tamanha fraqueza que é de longe superada por relinchos, mugidos, latidos e urros pseudossincronizados. A complexidade obteria valor negativo se não estivéssemos trabalhando no conjunto dos números Naturais. A norma culta é tão existente quanto é presente nas conversas monofônicas de mus musculus em caixas de polipropileno. Não vou comentar sobre Beethoven para não mais rebaixar a já rebaixada compositora carioca.

Como um primeiro passo para a quantificação da beleza, deveria haver além do estabelecimento de uma escala, o estabelecimento de um zero. Lembrando da escala Kelvin de temperatura, que seria um bom modelo, deveríamos procurar uma música simplesmente na qual não houvesse música. Apesar das críticas, as músicas da Tati Quebra-Barraco ainda são músicas. Péssimas, mas músicas. O que seria o zero da música? Uma não-música? Quem sabe a baderna de uma sala de crianças no recreio? Ou então o mais absoluto silêncio? Num quadro, então. Temos tela em branco e os rabiscos de Miró. Ambos são não-arte, embora o primeiro seja puramente uma não-pintura e o segundo seja pura e simplesmente “pintura”. E na literatura? O que seria litearatura e o que não seria literatura? O que faz um texto ser literatura? Na opinião da Luciana 38, plantonista de Português do CUJA (Cursinho pré-Universitário Jeannine Aboulafia), todos os textos são literaturas, pois todos podem ser analisados. Apesar da verdade contida na afirmação da colega, não são todos os textos que fazem a diferença. No nosso dia-a-dia, quando tratamos de literatura científica, já estamos pensando em textos, papers, que fizeram certa diferença em alguma análise de observações e/ou de experimentos acerca de algo da biologia, da química, e de outras ciências. Muitos dos textos, e possivelmente também este, não contribuem significativamente para o progresso da humanidade. Talvez chamemos esse tipo de obra de “obra de arte”. Talvez... E talvez seja este também um texto literário. Mais metalinguagem impossível.

Por fim, gostaria de concluir que minhas idéias, na verdade são inconclusivas. Espero pelo menos ter colocado um pulga atrás da orelha, e ter propiciado uma pequena reflexão sobre os julgamentos de arte, sem um discurso “politicamente correto”, tratando não-arte como arte, não-belo como belo. Sem basear a análise na falsa prerrogativa de que “gosto não se discute”. O que se confunde neste dito popular é “gosto” com “liberdade individual”. Já comentei a respeito em outros textos [1, 2], com a análise culminando na existência da adoração do não-belo, que também é não-arte. E também da existência, muito frequente, da rejeição do belo, da arte, e do que realmente foi importante para a humanidade avançar culturalmente com o passar das eras.

A nossa sorte é que não se depende de uma adoração do belo por parte de toda a população para essa evolução acontecer. Basta uma pequena parcela. Mas essa pequena parcela decresce e a preocupação se dá na recuperação da consciência das elites, daqueles que precisam conhecer o belo para fazer a diferença e sustentar, como Atlas, a humanidade em seus ombros e levá-la adiante, em sua progressão cultural e não rumo ao apocalipse do desdém, do funk da Tati Quebra-Barraco, de auto-retratos de um boneco de palha e da auto-destruição da nossa cultura.


1. Marcelo Gonzaga de Oliveira, ALEA IACTA EST,
http://aedisvocis.blogspot.com/2006/06/artistas-e-arteiros.html
2. Rafael Alves da Silva, Beligerante Probidade,
http://belprob.blogspot.com/2006/01/nova-roupa-e-nova-arte.html

15 Comments:

Blogger Oliveira Sampaio said...

Caro Gabriel! Vim oferecer algumas contribuições a seu ótimo post, que foi classificado por você mesmo como inconclusivo, mas que com certeza incentivam ao pensamento e reflexão acerca dessas idéias.
Sobre o "belo" no tempo, posso dar uma interpretação da "relatividade artística". Se analisarmos bem, veremos que são consideradas belas pois são uma visão do tempo em que os artistas (ou arteiros) viviam ou vivem. A arte moderna, então, não é nada mais do que a confusão das mentes modernas materializada na "arte". Prefiro enxergar o mundo com a clareza, por exemplo, dos Renascentistas.
A arte sempre foi e sempre será a contribuição das "pontas de lança" da humanidade. No nosso caso, vemos o produto dos maiores mediocres que já ousaram nascer... A "ponta da lança"! Pena que estava encravada na terra.
Gostaria de apontar também uma marca zero na escala que você tão espertamente sugeriu. Podemos colocar na escala zero tudo aquilo que não incomoda e não agrada. Assim conseguimos alcançar os esperados "patamares negativos" da arte - a "anti-arte" (deve-se levar em consideração que a análise será feita por alguém que, no mínimo, tenha capacidade de ponderar a respeito).
Acho, como disse a plantonista do CUJA, que tudo pode ser considerado arte; uma feita por artistas, outra por arteiros. E é nossa função apontá-los e diferenciá-los.

18/6/06 17:31  
Blogger Gabs said...

Concordo plenamente com a visão do mundo dos Renascentistas.
Quanto ao marco zero, alguns colegas pensaram a respeito e disseram que não poderia existir, visto que mesmo o silêncio é poético (principalmente após ouvir um caminhão passar... hehehe). Arte é arte, assim como música é música. Sua conclusão é semelhante à minha, no entanto, penso ser um tanto difícil criticar e apontar "anti-artes" enquanto a contingência não está em favor das análises e sim da contradição, do caos e da barbárie da civilização "pós-moderna"... Acho que nasci na época errada. hehehe..

29/6/06 23:30  
Anonymous Anônimo said...

Fiquei com a impressão de que você adota a convenção de que "poesia" é sinônimo de "poema", que por sua vez envolve a concatenação de palavras de maneira bela(?) e provida de significado. Se for esse o caso, então eu humildemente sugiro retirar esse elemento da definição de música, afinal, mesmo se compararmos obras sonoras significativamente bem compostas e que acompanham um poema, por exemplo uma ópera de Bizet, com um concerto instrumental de Mozart, não é difícil encontrar quem diga que o segundo é melhor. Imagine se compararmos com uma fuga de Bach (não pude evitar).
Agora, quanto à escala, quero lembrar que o conceito de temperatura deixa claro que existe um ponto mínimo ao qual aquela pode chegar, o que não é tão claro no conceito de qualidade artística.
Abraço

2/7/06 16:46  
Blogger Gabs said...

Muito bem colocado, meu rapaz. Já comentaram deste tópico comigo. realmente, poesia É poema no texto. Utilizei o jargão, para ficar mais facilmente identificável. Claro que percebi enquanto escrevia, mas preferi não colocar mais "parênteses" no texto. Quanto aos comentários da escala, acho que eles convergem no sentido de que não podemos ter um zero "teórico", mas um consenso, que permitisse avaliar tanto arte, quanto "anti-arte". Obrigado pelo comentário!

2/7/06 18:18  
Blogger alvestoteles said...

Este comentário foi removido por um administrador do blog.

5/7/06 02:46  
Blogger alvestoteles said...

Oi Gabriel. Venho torrar-lhe a paciência, mas com o melhor dos propósitos. Piorar mais ainda seu estado inconclusivo e trazer-lhe a idéia de que o drama é esse. No caminho da investigação sincera mais vale uma idéia que se admite duvidosa e digna de depuração do que uma crença imbecil.
Vamos ao tema.
Acho que houve um excesso de zelo pela definição do seu professor, colocada por você mesmo num estágio de maluquice e auto-contradição. Fez isso ao citar "o belo é aquilo que representa uma época" e qualificar a definição de "bela". Entendi que as aspas queriam dizer "no sentido que o tal professor dá ao termo". É por aí mesmo. Achei ótimo isso. Fiquei rindo um tempão. O Belo é Belo antes do primeiro homem existir e continuará sendo depois que sumir o último. Cabe-nos saber a que dado de realidade essa palavra se refere.
Você tratava do Belo e deu exemplos. Quando chegou na idéia de escala, que gostei muito, fez uma escala de outra coisa, deixando o Belo de lado. Disse que faria uma escala de quanto as coisas são músicas. Fiquei perplexo pois falávamos do Belo. Na sua escala, parece que você pegaria um sapato e perguntaria: Qual o grau de sapatez desse sapato? Ou, o quanto de música há nesse sapato? Diz "Apesar das críticas, as músicas da Tati Quebra-Barraco ainda são músicas." Eu também acho que música é música. Até aí tudo bem. Mas o quão belas são as músicas? Aí sim, segundo sua avaliação da TQB, entendo que ela tenha atingido um grau negativo. É música, mas música feia pra cachorro. As musas do caso são as mais vulgares da espécie. Agora vai dizer que o Belo é o que representa uma época? Esse treco todo não é Belo. É terrivelmente feio. E representa sim nosso Brasil. Grande parte de nossos compatriotas tem afinidade por tais musas. Por aqui, os genitais têm mais força motivacional do que o espírito.
A arte representa seu criador, óbvio, mas isso não tem nada a ver com boa arte. Há boa arte e má arte, sendo que a má arte é "anti-boa arte". Aconselho a busca pela essência do conceito, o quanto for possível. Isso só vem depois de muito pensar e investigar sobre o assunto. Fuja da definição de seu professor. Ela é escandalosamente ideológica, no sentido de que serve a outros fins que não à verdade.
Abraço.

5/7/06 02:50  
Blogger alvestoteles said...

Ah! Deletei o comentário anterior porque havia erros de gramática.
Abraço.

5/7/06 02:51  
Blogger Gabs said...

Meu estimado colega filosofante,
Então, começando pelo professor, destaquei a fala do mesmo por ser uma primeira definição de belo em toda a minha carreira como pensandor errante. Entendo que você tenha algum desprezo pela frase, mas a importância relativa naquele momento foi extremamente grande, não sendo, de fato, de grande importância absoluta para a Estética.
Sobre a TQB e música como exemplos de arte, faltou só fazer um link entre música e arte.. uma hora dessas eu dou uma recauchutada no texto. Música, no caso, era apenas uma manifestação de arte mais próxima do cotidiano, diferente de pinturas e esculturas, ficando assim, mais fácil ocorrer assimilação por parte do leitor do mote do meu texto.
Grande abraço e obrigado pelos comentários.

6/7/06 13:36  
Anonymous Anônimo said...

Gabriel,
belo o seu texto. Mas, antes que me interrogue, peço desculpas antecipadas por não saber definir a beleza que ele me transmite. Apenas sinto e contemplo: é um belo texto. Talvez porque tenha movimento, interlocuções (com seus amigos, com um professor do passado, com Fernando Pessoa ou Miró). Definitivamente não ouso em definir o que não me exige definição. O sentimento do belo existe anteriormente a qualquer conceito.
Ao ler o seu texto, fui lembrando de várias passagens históricas que concernem à arte. A arte foi a primeira manifestação humana de transformação no mundo. Com os gregos ela foi tratada como "techné", isto é, técnica. Arte, para os gregos, é um conjunto de regras para bem se produzir algo (aqui me recordo de um grande professor meu da Filosofia...!). Isso significa que uma cadeira ou qualquer objeto criado é arte. A palavra "arte" vem da composição da palavra latina "ars" com a "techné" grega.
Na Grécia Antiga a arte não estava ligada ao belo. A arte era uma produção (poiesis). No Renascimento é que houve a distinção entre belas-artes e artes mecânicas. As artes mecânicas eram aquelas que produziam coisas ligadas à utilidade e não tinham qualquer relação com o belo necessariamente (a medicina, a agricultura e a culinária se encontravam nesse rótulo). As belas-artes nesse período eram sete: o teatro, a dança, a música, a arquitetura, a poesia, a escultura e a pintura.
Na Modernidade, fruto do Renascimento, percebemos um distanciamento daquela noção de arte grega: a arte não é mais técnica. A técnica ficou vinculada à Ciência (produtora de tecnologia e não de coisas belas) e a arte vinculou-se à produção de coisas belas (as ainda hoje chamadas "obras de arte"). Foi na Modernidade também que se denominou a Estética como "ciência do belo". Isso, podemos também reconhecer, é algo bem iluminista, em que todo conhecimento começou a ser validado pela Ciência. Segundo os modernos, o belo era a única categoria estética a ser alcançada pela integibilidade. E as outras categorias estéticas?! Todas as outras foram excluídas por não serem consideradas tão "superiores" como o belo. O feio era algo ligado a uma certa incapacidade intelectual. "Estética" diz repeito aos sentidos (cheiros, sons, etc), isto é, não à razão, mas às sensações. As sensações que não se reduzem ao belo, mas também ao nojo, ao feio, ao grotesco e várias outras sensações que podemos sentir. Nesse período, a arte ficou reduzida ao belo.
No século XX, com a arte nova, uma mudança radical foi proposta à criação artística: novas formas, novos modos de se reconhecer a arte. Os sons dos rádios portáteis como produtores de sinfonias polifônicas, as formas cúbicas de Picasso... tudo isso nos mostra uma nova forma de ver o mundo que não é exatamente através do belo ou de uma simetria inteligível que nos remete a ele, mas às formas assimétricas, descompassadas e dissonâncias desafinadas a um ouvido despreparado para outras possibilidades. Coisas belas não necessariamente precisam ser arte e a arte não necessariamente precisa ser... bela. A arte, quando produtora de sensações e sentimentos, nos toca de algum modo... e permanece no tempo como que inexplicavelmente. Ela não se desgasta, não envelhece, mas se renova a toda e qualquer época. De algum modo, concordo com seu professor quando disse que o conceito de belo pertence aos períodos históricos (qualquer padrão estabelecido pertence ao momento em que foi pensado), mas a arte enquanto produtora de sensações inigualáveis e não somente produtora do que dizem ser O Belo (único e absoluto, comum a todos) é sempre renovada, pois é sempre reconhecida, ainda que de maneiras distintas, através dos tempos porque ela é capaz de tocar o ser humano em algum lugar.
E quanto à Tati Quebra-Barraco?! Isso (aqui é uma opinião extremamente pessoal desligada de referências históricas) é uma manifestação popular. Uma manifestação popular que não é "obra de arte" como algumas manifestações são, mas que remete a um pequeno grupo social de uma cidade. Pertence a uma realidade social. Com o tempo vai passar porque tornou-se comércio e moda. Quem vive mesmo o funk, na verdade, não ganha nada com isso. Ganham apenas aqueles que se expõem como "artistas". O funk carioca é, na verdade, a evidência de uma situação econômica e social de um país. O funk não é um problema estético, mas social, pois indica o quanto o Brasil está ruim socialmente.
Termino aqui, mas ainda fico com a questão sobre a relação entre Ética e Estética que, claro, vou deixar para um outro momento... rs
Desculpe um texto tão longo... as pessoas que o lerem ficarão cansadas...
Como sempre, seu texto está tão rico que minha reflexão não queria mais terminar...rs
Desculpe a todos pela falta de educação.
Abraços a até mais.

7/7/06 16:26  
Anonymous Anônimo said...

Gabriel, desculpe-me a falta de percepção, é que para mim o seu texto não convergiu para lugar nenhum, e achei que a sua conclusão inconclusiva confirmasse a minha suspeita.

Rafael, será que você poderia nos dar uma pista do que seria o Belo? Ou quem sabe apontar uma direção na qual procurar? Queria contestar a definição do (também meu antigo) professor, mas não tenho cacife para isso...

Vanice, como vai?
Certamente aprendi muito com o seu comentário, mas me incomodou bastante o trecho que eu tão estrategicamente destaco: "O funk carioca é, na verdade, a evidência de uma situação econômica...".
Eu entendo que o funk carioca seja a evidência da situação cultural deplorável de um país, uma manifestação da imoralidade do "pequeno grupo social" que produz e consome esse tipo de música. Onde é que entra a economia nisso tudo? Será que você assume que a dita situação cultural seja fruto da econômica (e social, não me esqueci) do país?

Já torrei o suficiente.

10/7/06 09:20  
Anonymous Anônimo said...

Oi Vitor,
sei que não me prendi muito ao final do comentário, sobre o funk, mas considero, sim, que isso seja uma manifestação popular a partir de determinado contexto. Ainda hoje o Brasil produz arte é só procurarmos por ela porque não é a televisão que vai nos mostrar. Temos a Bienal de Artes de SP, festivais de música de concerto, inclusive contemporâneas e muitos poetas e escritores. Na música popular temos vários grupos que estudam de fato a cultura brasileira e compõem através dela. Não podemos esquecer também as várias bandas de metal que temos por aqui e que fazem ricas interlocuções com a música do Brasil. O funk, como se encontra hoje (pode não ter sido em sua origem, já que originalmente não é brasileiro, mas norte-americano e com qualidades não duvidosas) é, de alguma forma (não de forma absoluta) um espelho de uma realidade (como disse é uma opinião pessoal). Para mim, esse grupo que vive o funk é fruto de várias situações e não apenas da econômica... agora quem consome é outra história porque o consumidor do funk não faz parte da vida do "funkeiro". Não é um pequeno grupo que consome, mas um grupo enorme. Esse grupo é aquele que consome a moda e pensa que funk é cultura brasileira, o que eu penso que não é. Mas o perigo é justamente esse: se todos acreditarem que essa é a cultura brasileira, ela se tornará a cultura brasileira, pois ficará cada vez mais identitária à sociedade. Tecnicamente, não posso falar de economia, mas não posso deixar de olhar o quanto não é por acaso que o Brasil está como está.
Grande abraço

10/7/06 14:19  
Anonymous Anônimo said...

Oi Vitor,
revi meu comentário anterior e retifico: como uma manifestação popular o funk até é uma cultura brasileira. É a cultura de uma parte do Brasil e de um certo momento. O que discordo é que seja Cultura Brasileira, isto é, que "define" uma sociedade ou povo. O futebol, por exemplo, é assim. Acredito que o funk ainda não teve tempo para isso.
Abraço!

11/7/06 10:54  
Anonymous Anônimo said...

amei o texto gabs...
alias axu q fui uma das primeiras pessoas a ler esse texto... pq vc mal tinha acabdo de escrever qdo cheguei na sua casa!!
vc é ótimo com a escrita, com as palavras, viu...
bjussss

27/7/06 15:42  
Anonymous Anônimo said...

Olá Gabriel!! Tudo certinho? Cara, seu blog é muito classe A, sério : )

Eu ainda não arrumei o meu blog direito mais já abri um link pra vc lá. A gente se fala!
Beijão

www.christie.zip.net

27/7/06 21:30  
Blogger Dri said...

Querido,
A minha total paixão por Miró e pelo Fernando Pessoa estão sendo deixadas de lado nesse instante. Não estou nem um pouco interessada em recomeçar uma discussão do quanto isso é arte ou não-arte. Arte é expressão, ou seja, elas emitem uma mensagem, eu a recebo, faço minha descodificação e estou muito satisfeita assim. Caso você queira podemos discutir isso pessoalmente algum dia.
Achei o seu texto super interessante e muito bom. Certamente meu comentário não terá explanações tão claras como as suas, principalmente por estar um tanto quanto enferrujada na arte da escrita.
Pensei em vários comentários durante o seu post. Acho que com o passar do tempo, acabamos tendo uma explosão demográfica, diversificação cultural e até acesso a essa diversificação. Perante isso, não enxergo uma maneira exata de eleger o representante do Belo atual. Digo isso, porque você mencionou as curvas do Niemeyer como uma possível referência. Quando estabelecemos marcos de beleza, acabamos pegando um monte de pessoas diferentes, juntando-as em uma embalagem e colamos um rótulo. No mundo contemporâneo (hihihihihi... não tem referência melhor? Historiadores.. criatividade, por favor) existem muitas pessoas e acho que fazer uma classificação tão global de belo acabaria resumindo e/ou rotulando demais. Como ainda estamos inseridos nessa sociedade, e não temos o distanciamento de tempo suficiente fica difícil estabelecer essa referência.
Começo do século XX, por exemplo, quando pensamos em arte logo vem o Modernismo na mente. Perfeito na linha temporal de criação de arte, mas lembra que a aceitação da arte moderna foi difícil pela sociedade? Mesmo entre os artistas ouve várias diferenças e brigas, entrentanto a marca, o slogan do movimento é "orgia intelectual". Para facilitarmos o estudo do passado juntamos tudo isso e chamamos de Modernismo.
Podemos falar mais disso pessoalmente, só quis registrar a linha de raciocínio por aqui.
Beijos

PS: Quanto a crítica do nome contemporâneo... o Eric Hobsbawn classificou algumas fases da história por Eras e o século XX (começando na primeira guerra indo à queda do Muro de Berlim) foi classificado como Era dos Extremos, e é a mais curta de todas. Creio que a velocidade da comunicação acabou relativizando o tempo, não sei como serão os ciclos históricos agora....
PS'': Meninos, que obcessão pela conclusão... é sua influência exatóide, Vitão?

31/8/07 22:20  

<< Home